Muitas vezes, incorremos no
erro de limitar o processo avaliativo à momentos de testes ou provas pontuais.
Porém, na medida em que a Filosofia adentra e fixa-se como epistemologia
peculiar e metaespitemologia a questão da avaliação se torna conflituosa e
urgente de reflexão do seu papel em nosso agir pedagógico e filosófico. Para
tanto, se lança o convite de revisitar os propósitos fundamentais da avaliação
educacional presente na origem da reflexão filosófica grega sobre a educação.
A função da Filosofia, já no
período naturalista, é ver aquilo que é necessariamente já visível à ciência e
abrange a dimensão do oculto. Nesse sentido, nos afastamos de questionários
clássicos que se apartam da reflexão com a realidade. Uma Filosofia que foge ao
compromisso com os grandes pensadores que habitaram nossa história não
apresenta horizonte de emancipação da realidade.
Desse modo, como fica o ethos - o comportamento - do filósofo
diante do pensar?
A proposta grega de Paideia como educação integral carrega
inúmeras e vigorosas reflexões sobre essa questão, não somente no período
clássico. A modernidade também faz uso dessa postura filosófica frente a
educação quando lança o movimento enciclopedista.
Enciclopédia significa ciclo
da Paideia, ou seja, envolver-se no
processo educacional. Durante o surgimento da filosofia moderna no século XVIII,
surgiram vários intelectuais e pensadores que tinham a característica de ler
muito antes de escrever: Thomas Hobbes, John Locke (esses ainda no século XVII)
Voltaire, Montesquieu e Rousseau. Esses pensadores colaboraram de alguma forma
para a publicação da Enciclopédia, livro idealizado pelo matemático D'alembert
e pelo filósofo Denis Diderot e que tinha a pretensão de registrar todo o
conhecimento humano nas mais diversas áreas em um único livro.
Se para os gregos a educação
era Paideia, para os romanos acrescenta-se
o ideal de cultivo do espírito, assim como se cultiva o campo. Nesse sentido,
uma educação sem cultivo, sem acompanhamento (avaliação no sentido pleno do
termo), é estéril. Enquanto o cultivo da educação habita a esfera política, a
educação é política por excelência, o que é de interesse comum deve ser
exercitado de maneira comum.
A educação para os romanos,
em especial os estoicos das Escolas filosóficas imperiais, é compromisso
civilizatório, abrange aquilo que desejamos enquanto sociedade e não pode
jamais ser confundida como instrução para o trabalho, embora compreenda também
o mundo do trabalho como uma das dimensões em destaque no processo formativo
para a cidadania plena. O ideal helenista de Educação afirmava que “buscar em
toda parte o útil é o que menos convém a homens magnânimos e livres”.
A educação representa a meta
de todos os esforços humanos em busca da beleza. Cultura e civilidade estão
amplamente ligadas ao processo educacional. A educação pode até não formar o
gênio, mas forma o público, nesse ponto reside a particularidade da escola
pública. Há significados fundamentais que estão passando ao largo da história
dos nossos alunos.
O escopo da educação formal
é o aprimoramento da capacidade de discernir. Discernir sobre a multiplicidade
de caminhos, em latim curriculum. A
linguagem, enquanto diversidade de “dialetos”, pode abrir clareira para o
desafio da multiplicidade. Nesse sentido é importante situarmos que os discursos
políticos e pedagógicos estão plenos de receptáculos à diversidade e ao direito
de cada pessoa em ser quem é independentemente e acima de qualquer coisa.
Contudo, a apologia da multiplicidade significa adesão a ela? Para Deleuze,
não. “Não basta dizer viva o múltiplo. É preciso fazer o múltiplo.” (DELEUZE, 2003,
p.14).
Temos diante de nós,
professores de Filosofia que somos, a necessidade de criar uma adaptação
dinâmica e constante do Currículo dentro de conduta de atenuação plausível diante
de todo arcabouço reflexivo que a história da humanidade nos fornece. Caminhamos
para o múltiplo, ou aquilo que algumas correntes pedagógicas nomeiam como flexibilização
do currículo. Lembrando que a loucura de uma época é a civilização de outra
era.
A tarefa de ensinar a ler e
a escrever um texto de Filosofia é do professor de Filosofia e não do professor
de português. Apresenta-se diante dessa perturbadora sentença a urgência de
fazer com que nossos alunos adquiram uma postura filosófica diante da leitura.
Talvez isso possa encontrar seus primeiros passos na medida em que o professor
passa a ler junto com os alunos os textos puramente filosóficos.
A missão da Filosofia passa
pela elaboração de questões existenciais e complexas sobre a vida aos nossos alunos,
mas, sobretudo, também é nossa missão de caráter eminentemente filosófico desfazer
problemáticas ou ao menos promover uma reflexão que contribua para isso. O
estudante deve ter acesso direto à filosofia. O professor não pode ser
obstáculo para isso. Discutir por meio dos textos pode ser a minha morada como
professor de Filosofia.
Tal mudança de postura, na
qual o educando é colocado face a face com a Filosofia, contribui para com que
o aluno aprenda a investigar suas limitações. O filósofo dá um passo atrás, percorre
o caminho não como uma seta condenada a ir sempre em frente, só vislumbrando o
destino e convertendo-o em obsessão, mas como quem sabe que há outros passos
sob os seus e horizontes ainda não contemplados à sua frente. Esse é nosso ethos, que poderíamos nomeá-lo de pedagogia
do recuo ou pedagogia do caminho. Essa contribuição da específica da Filosofia
deve contagiar também as outras áreas do conhecimento para que a escola possa
vislumbrar o espetáculo de uma consciência que pensa.
Alex Rodolfo Carneiro
PCNP
– Filosofia
*Texto apresentado na Orientação Técnica aos professores de Filosofia da Diretoria de Ensino da Região de São José dos Campos - SP
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