Blog orientado pelo Núcleo Pedagógico da Diretoria de Ensino de São José dos Campos - PCNP de Filosofia e Sociologia

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Temas de Atualidades: A Ilusão das Redes Sociais

 
      O narcisismo, a superficialidade e o distanciamento, entre outras características das relações virtuais, formam pessoas cada vez mais individualistas e egoístas.
      Para a filósofa Hannah Arendt [Filósofa alemã naturalizada norte-americana, 1906-1975] "o isolamento torna os indivíduos manipuláveis e controláveis, como coisas". Quando ela analisou os totalitarismos do século passado, apontou para o projeto desses sistemas de tornarem os homens supérfluos. Para tanto, entre outros expedientes, mantinham as pessoas isoladas umas das outras. Separavam-nas de seus familiares, de suas comunidades, inclusive das pessoas com quem coabitavam nos galpões dos campos de concentração, instaurando entre elas a suspeita e o medo de delações.
      Na nossa atualidade o isolamento tem um perfil diferente, porque é mais voltado para a intensificação do individualismo, cujos interesses afastam-se a cada vez mais das questões sociais. (...) Arendt tem pressuposto de sua análise a condição humana, ou seja, o fato de vivermos entre homens e jamais chegarmos a ser um ser humano nem mesmo os indivíduos que somos longe da companhia dos outros. Os outros, tanto quanto o ambiente em que vivemos, nos constituem, daí que, se o distanciamento interpessoal for se estabelecendo como nova condição de existência, nossa própria humanidade poderá sofrer o impacto de uma mutação.
      Já em 1927, em seu livro Ser e Tempo, Martin Heideger [Filósofo alemão, 1889-1976] percebia esse comportamento cotidiano dos indivíduos de tomar tudo pelo aspecto e o nomeou de "avidez de novidades". O que interessa é sempre a próxima novidade, o próximo assunto, a próxima notícia... Também identificavam como "falação" um comportamento complementar: todos falam sobre tudo, sabem de tudo, mas não compreendem nada profundamente.
      Parece que a "falação" e "avidez de novidades" estruturam a participação nas redes sociais. As pessoas já estão acostumadas a comentários rápidos e superficiais sobre tudo e todos. É fácil ver nesses comentários a preocupação de cada qual em simplesmente dar sua opinião, mais do que ouvir a alheia. A opinião do outro é apenas a oportunidade para se expressar a sua própria. O outro parece importar, mas de fato não importa. Importam apenas a própria posição e a autoexposição. Daí a constante informação sobre as viagens, os pensamentos, as emoções, as atividades de alguém. É preciso estar em cena e sempre. Zygmunt Bauman, sociólogo polonês, tem apontado para a necessidade das pessoas, sobretudo dos jovens, de se ocuparem sobremaneira com sua imagem nas redes socais. Elas precisam escolher as fotos que melhor as apresentem, que as tornem atraentes e desejáveis. Aquelas que não souberem se vender correm o risco da invisibilidade e da exclusão.
      Meu propósito, aqui, foi apenas o de levantar dados para uma reflexão. Mas quero acentuar que essas tendências das redes sociais - a virtualidade, o distanciamento, a superficialidade, a superfluição do ser humano, a exposição narcísica, a ilusão de intimidade e popularidade, a "falação" e a "avidez de novidades"... - constituem o padrão de isolamento das relações pessoais. E quanto mais isolados, mais ficamos à mercê de controles e manipulações. Cada vez mais ameaçados na autoria do nosso destino pessoal e político.
 
Dulce Critelli. Tecnologia. Revista Carta na escola. Editora Confiança, n. 81, novembro de 2013, p. 54-56.
 
 

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